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Posicionamento da Unidade Preta Comunista (UPC) sobre as eleições

Desde que se fundou a sociedade dividida em classes – uma maioria que trabalha e uma minoria que manda, uma maioria que produz toda riqueza e uma minoria que se apropria dessa riqueza sem que tenha movido um músculo para produzi-la – há cerca de 12 mil anos – foi necessária a criação de um organismo que cumprisse o papel de organizar essa dominação. Esse organismo é o Estado.
            Na sociedade atual a classe dominante é a burguesia, formada pelos capitalistas, os grandes empresários, ao passo que a classe dominada é o proletariado, formado pelos trabalhadores, aqueles que produziram exatamente tudo que teus olhos veem e que não é obra direta e exclusiva da natureza. Tirando o céu, o mar, os rios e a vegetação, tudo que está ao teu redor foi feito pelos trabalhadores e não pelos que enriquecem à custa do nosso trabalho (e mesmo se tratando das árvores, das plantas, do curso dos rios – como o Rio São Francisco, por exemplo – em muitos casos houve a intervenção de trabalhadores). O Estado burguês nada mais é que essa máquina composta por várias peças cujo objetivo é manter a sociedade funcionando exatamente dessa forma.
            Todas as injustiças que conhecemos são consequências necessárias dessa forma de organizar a sociedade, logo, enquanto essa sociedade existir, viveremos as mais variadas formas de injustiça. Governos são somente administradores escolhidos para gerenciar esse funcionamento, gerenciar a nossa exploração pela minoria burguesa. E não é trocando gerente A por gerente B ou C, que poremos fim à nossa opressão. Nossos sofrimentos até podem ser minimizados durante um determinado período de acumulação de capital que venha a corresponder ao tempo de gestão de um determinado governo, seja da extrema direita (começo dos anos 1970, na ditadura empreserial-militar), ou de esquerda (os primeiros mandatos do Governo PT). Porém, esse desafogo tem prazo de validade que, mais cedo ou mais tarde, se encerra.

            Se, como diz o ditado, depois da tempestade vem a bonança, sob o capitalismo a recíproca é mais que verdadeira. Todas as insustentáveis bonanças experimentadas durante governos progressistas são necessariamente sucedidas por verdadeiras tempestades, como a que vivemos atualmente, como a vivida no Chile pós 1973, como a tragédia nazista nascida das entranhas do governo de conciliação social democrata alemão. Mesmo que involuntariamente, esse é o papel das esquerdas que assumem a administração do Estado burguês: criar condições para a ascensão da extrema direita. Propostas de lutas por dentro das instituições do Estado inimigo devem ser rechaçadas por toda a classe trabalhadora, sobretudo por nós, a maioria preta.

            E a nossa história no Brasil constitui uma verdadeira aula a esse respeito. Entre 1850 – Lei Euzébio de Queiroz – e 1888 – Lei Áurea – vasta legislação abolicionista foi criada, debatida e aprovada. A fé nas instituições da classe dominante frearam as lutas dos nossos ancestrais pela sua libertação, além de deslocar para os brancos o seu protagonismo. O resultado foi uma abolição cuidadosamente arquitetada para manter a população preta não só na base, como no subsolo da pirâmide social. E cá estamos nós ocupando o mesmo lugar mais de um século depois (aqui é importante não fazer confusão entre ascensão de alguns indivíduos pretos e emancipação. O fato de terem existido pretos senhores de escravizados, ao invés de emancipar, só fortalecia um sistema que, para existir, precisava de senhores e de escravos).
            Há, contudo, uma atmosfera diferenciada na eleição de 2022 da qual deriva um apelo maior à nossa participação. Ela se baseia numa questionável polarização entre as duas principais candidaturas. Ora. Se Bolsonaro esteve na base aliada do Governo PT por 13 anos, se PT e PSL (partido pelo qual se elegeu Bolsonaro) coligaram em quase 150 municípios nas últimas eleições e se hoje Bolsonaro é candidato pelo partido do vice presidente dos dois mandatos de Lula, a tal polarização não passa de uma chantagem com a qual tentam nos envolver nesta farsa. Na promiscuidade da jogatina eleitoral, os adversários de hoje são, sem o menor pudor, os aliados de amanhã e vice-versa.

            Outra tentativa de nos chantagear se baseia no comportamento criminoso do atual governo com relação à pandemia. Mas o que dizer da frente que reúne os partidos que dirigem a grande maioria dos sindicatos do país e nada fizeram para forçar o governo a assumir outra postura no combate à pandemia, apostando, ao invés disso, no desgaste do candidato à reeleição, prestigiando a luta eleitoral em detrimento de centenas de milhares de vidas? Em sua defesa, essa militância alega que seus partidos não têm mais poder de mobilização para além das eleições. Se isso é verdade, esse é um dos mais contundentes depoimentos contra esses mesmos partidos que insistem em priorizar a luta eleitoral. Mas acontecimentos como a “greve” geral de abril de 2017 (28A), que conseguiu parar o país, causando um prejuízo de 5 bilhões só no comércio e que foi organizada por essas mesmas forças, colocam em dúvida tal afirmação.

            Apesar de não ser tudo, o exposto até aqui já é o suficiente para justificar nossa firme posição pela não participação neste processo eleitoral. No lugar de permitir sermos tragados e distraídos pelas eleições, devemos superar a inércia e o individualismo, nos organizarmos e partirmos para a ação coletiva por onde quer que se realizem as relações de produção e reprodução dessa nossa vida sob as rédeas do capitalismo, seja nos espaços de moradia, estudo ou trabalho.

13 de setembro de 2022
Unidade Preta Comunista

Quer se aprofundar na discussão? Assista ao vídeo desse debate no qual participamos com o pessoal do podcast Comboio Suburbano!

4 respostas em “Posicionamento da Unidade Preta Comunista (UPC) sobre as eleições”

Abaixo, nossos textos sobre essas eleições para a crítica de vocês:

Lula-Alckmin: de quem são amigos e de quem são inimigos? Essa é uma questão fundamental! (1ª parte)
https://cemflores.org/2022/09/19/lula-alckmin-de-quem-sao-amigos-e-de-quem-sao-inimigos-essa-e-uma-questao-fundamental-1a-parte/

O fascista Bolsonaro é amigo dos patrões e inimigo das classes trabalhadoras! (1ª parte)
https://cemflores.org/2022/08/05/o-fascista-bolsonaro-e-amigo-dos-patroes-e-inimigo-das-classes-trabalhadoras-1a-parte/

O fascista Bolsonaro é amigo dos patrões e inimigo das classes trabalhadoras! (2ª parte)
https://cemflores.org/2022/09/03/o-fascista-bolsonaro-e-amigo-dos-patroes-e-inimigo-das-classes-trabalhadoras-2a-parte/

Teria a burguesia brasileira se tornado “democrática”?
https://cemflores.org/2022/08/15/teria-a-burguesia-brasileira-se-tornado-democratica/

Brasil: o “paradoxo” de uma economia estagnada com lucros crescentes
https://cemflores.org/2022/06/10/brasil-o-paradoxo-de-uma-economia-estagnada-com-lucros-crescentes/

Lula-Alckmin: de quem são amigos e de quem são inimigos? Essa é uma questão fundamental! (2ª parte)

A “esquerda” reformista representa, objetiva e subjetivamente, a busca incessante de enganar a classe operária e a massa trabalhadora, iludi-la com seus acordos e conchavos, desorganizá-la em relação à luta pelos seus próprios interesses, substituindo sua organização e luta pelas ilusões do cretinismo eleitoral. Os/as comunistas precisam criticar diretamente e sem meias palavras o oportunismo e o reformismo!

Leia a íntegra no sítio do Cem e nos mande sua crítica:

https://cemflores.org/2022/09/26/lula-alckmin-de-quem-sao-amigos-e-de-quem-sao-inimigos-essa-e-uma-questao-fundamental-2a-parte/

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